o clitóris é uma linha direta para a matrix — VNS Matrix
Mulheres, eles sempre dizem,
estão amarradas a terra
e são tão enroladas
com todos seus ciclos e fluxos confusos.
E ainda assim, por outro lado, as mulheres são tão artificiais para os homens: questões de glamour, de ilusão, de trapaça. Até mesmo suas bases são cosméticas: ela é inventada. Dificilmente isso é um problema na cibernética, onde o natural e o artificial derretem-se ao se encontrarem. Não é de se admirar que as mulheres tão rapidamente se tornem avançadas e destemidas praticantes da engenharia virtual.
A identidade masculina tem tudo a perder com estas novas técnicas. A contagem de esperma cai enquanto os replicantes se agitam e a carne aprende como aprender por si mesma.
Cibernética é feminização. Quando o espaço inteligente emerge ao lado da história da libertação da mulher, ninguém é responsável. É esse o ponto, a dobra no mapa, onde os arquitetos se perdem no padrão. Sistemas autoguiados não estavam nos planos.
Traçar a emergência do ciberespaço: da história do comércio até o ponto em que o capitalismo se torna um sistema auto-organizado; da história da mediação ao momento da imersão. A guerra, é claro, é um caso exemplar: o próprio teatro de guerra se torna um ciberespaço.
A buceta construída ativa o programa. Transmissões virais aparecem na tela. Imagens baixadas convergem com sua própria engenharia. Mercados e mídia: máquinas militares. Pretendidas como que para servir o homem na sua missão de dominação planetária e escape das corrupções de uma carne problemática, a matrix esteve sempre com Ele. Ele captura a imagem conforme isto entra em contato.
Tudo que importa, ativa-se. A natureza nunca esteve esperando pelo homem. A matéria é microprocessamento: o que mais as moléculas fazem consigo mesmas? Não existe necessidade de suavizar as arestas do mundo virtual. A matrix em todo caso já hackeou todas as tentativas autoconscientes de molda-la à imagem do homem do que é a natureza e do artifício.
Os viajantes sempre deixam sua marca, e o que eles percorrem, por sua vez os marca também. A humanidade não pode escapar de seus próprios reprocessamentos. As technoscapes são prévias de uma futura decomposição do espetáculo. Produzidas em seus próprios códigos maquínicos onde o zero há muito tempo interrompeu o ponto inicial; essas viagens são tão deliciosamente alienígenas quanto suas próprias fabricações fractais.
NATURALMENTE, ZONAS FORA DA LEI ESTÃO SURGINDO.
AUTOMATICAMENTE.
Clarice Pelotas
Travesti, xenofeminista e tradutora.
Caeli Corvere
Psicanalista, graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Orienta seus estudos pelas áreas da psicanálise, anarquismo, filosofia política, tradução e epistemologia. Mais uma zero à esquerda.