Estando a algum grau impactados ao observar o espetáculo democrático europeu dos últimos dias, seria interessante acompanhar também os últimos desenvolvimentos de ao menos uma das lutas dos trabalhadores(as) que ocorrem intensamente na Europa e sua relação com seus Estados – e com o capital. Para isso, traduzo abaixo o que escreveu a revista Resistance – Stimme des Widerstands, em publicação de 17/11, reproduzido adiante nas páginas da Revolutionärer Jugendbund (Liga da Juventude Revolucionária), da Alemanha, sobre a imensa greve de trabalhadores da metalurgia ocorrendo desde terça-feira em Cádiz (Espanha). A greve, iniciada na terça-feira (16) e rendida com ampla violência desde o início, já formou barricadas, tomou o controle de áreas industriais, ferrovias, portos industriais, e vem recebendo repressão cada vez mais dura do governo de Pedro Sánchez, além do quase total silêncio nas mídias. Essa repressão surge ao mesmo tempo em que os democratas choram suas benevolentes lágrimas no Parlamento Europeu. Diante de Lula, nosso metalúrgico, eles aplaudem e falam em democracia. O ex-presidente espanhol Zapatero, por exemplo, fez um discurso emocionante, expressando fé em Lula para a presidência. Terminou dizendo: “e espero que seja com a União Europeia à frente!”. Todos se emocionaram e choraram de alegria. Contudo, quando se trata de seus próprios trabalhadores da metalurgia e outros setores: arrocho, porrete e desemprego. As notícias acerca do levante de Cádiz basicamente não estão circulando no momento, mesmo na Europa — a não ser quando figuram em defesa das associações patronais. Esta tradução busca, assim, contribuir para algum discernimento nesse mar de confusão e de pequenos (ou grandes) “espetáculos”. Segue abaixo:

 “Desde terça-feira, 16/11/2021, os trabalhadores(as) da indústria metalúrgica na cidade espanhola de Cadíz e Porto Real, localidade vizinha, encontram-se em greve por tempo indefinido. O apelo dos sindicatos dirige-se a cerca de 20.000 trabalhadores da região, seguindo longas negociações e curtas greves pacíficas anteriores, que não conseguiram encontrar uma solução. Diferentemente de antes, os grevistas agora marcham combativamente e sem compromissos firmados. Desde a meia-noite de terça-feira, eles não só pararam o trabalho nas fábricas como também ergueram barricadas nas entradas das centrais de produção e dos portos industriais. A polícia reagiu imediatamente com o envio de forças especiais já reunidas em outras regiões. Em total elo com as associações patronais, a tentativa era orientada para que o protesto fosse ‘sufocado no berço’ logo na primeira noite. Para isso, procederam com repressão de extrema brutalidade; às pedras lançadas e tábuas em chamas, seguiram tiros de balas de borracha e gás lacrimogêneo. 

Foto de Nacho Frade para o Europa Press.

A resistência, contudo, não pôde ser até agora rompida. Os trabalhadores estão atualmente se defendendo com decisão e militância, chegando mesmo à ocupação da rodovia e da linha férrea de Cádiz desde então. Grandes partes das áreas industriais estão sob seu controle, embora estejam cada vez mais sitiados por forças policiais fortemente armadas, que por sua vez não hesitam em abrir fogo sobre grupos de pessoas sem que haja necessidade de provocação. Até agora, as informações sobre feridos provém apenas da polícia, com base em suas próprias fileiras. Com exceção da mídia regional e de esquerda na Espanha, esses eventos mal receberam qualquer atenção nas reportagens. Os grevistas não estão apenas buscando impulsionar os debates sobre aumentos salariais marginais, levados adiante juridicamente pelos sindicatos e associações de empregadores. Na província de Cádiz, há uma taxa de desemprego de quase 30%, e muitas pessoas só podem ganhar a vida, ao nível da subsistência, através do trabalho assalariado. Como em toda parte, a crise do coronavírus tornou tal situação ainda mais difícil, em especial para esta parcela da população. A indústria metalúrgica representa um dos maiores empregadores regionais. Mas agora, a gigantesca empresa internacional Airbus quer realocar sua unidade de produção em Puerto Real para uma cidade que seja mais lucrativa para eles. Assim, ampla resistência ao fechamento vem ocorrendo desde o verão. O motivo dado para o fechamento? Perdas ocorridas devido à crise do coronavírus. Isso tudo considerando ainda que o conglomerado (em contraste com a Boeing, por exemplo) demonstra agora ter lucros novamente. 

Os aumentos salariais de apenas 0,5 por cento propostos pela associação patronal ‘Femca’ (Federación de Empresarios del Metal) só podem, portanto, ser pura zombaria; somada ao fato de que eles retratam os protestos legítimos e desesperados como simples atos de ‘vandalismo’, ao passo que aplaudem o avanço e ação brutal das forças especiais da polícia. Tudo isso está acontecendo sob os olhos do governo centrista e social-democrata espanhol de Pedro Sánchez, cujo partido se descreve como ‘socialista’, tendo feito falsas promessas antes das eleições para melhorar a situação da classe trabalhadora. Atualmente, essa dinâmica pode ser reconhecida em quase todos os lugares, inclusive na Alemanha. Os trabalhadores de Cádiz e de Puerto Real mostraram que, em última instância, só a militância pode fazer frente ao capital, ao Estado e à polícia”.

Tradução e comentário de Éric G. Gaúna

Link do texto de origem.



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