Hegel escreveu mais sobre a Índia que sobre o mundo grego, explorando pontos de convergência e diferença.

Por Aakash Singh Rathore

Em termos de número absoluto de palavras, o grande filósofo alemão Georg Wihelm Friedrich Hegel dedica significativa atenção em seus extensos escritos tanto para a Índia e seu pensamento como para o mundo grego. Efetivamente, Hegel escreve mais sobre o que ele descreve como mundo “oriental” do que sobre os gregos.

Embora muito tenha sido escrito sobre Hegel, concluindo que sua abrangente Enciclopédia das Ciências Filosóficas é uma passagem estendida da Metafísica de Aristóteles, há um silenciamento por parte dos críticos da passagem muito mais longa do erudito, poeta e místico sufi do século XIII, Jelaleddin Rumi, que precede o próprio Hegel e sobre o qual o filósofo diz que “não pode deixar de citar”. Na verdade, os críticos ignoram em silêncio o fato surpreendente de que a culminância do sistema hegeliano – isto é, a Filosofia como a expressão mais elevada do Espírito Absoluto, tal como articulado nos parágrafos finais da Enciclopédia – consiste em 12 páginas de texto, 10 delas dedicadas a arte, religião e filosofia indianas. Por que esses conteúdos apareceriam precisamente no final, na culminância de tudo?

Um envolvimento contínuo com a Índia é parte integrante do pensamento de Hegel, de forma que ainda não foi explorado na pesquisa hegeliana (ou nos Indian studies). É notável quanto esforço Hegel despendeu no que ele caracterizou frequentemente como “fantástico”, “subjetivo”, “selvagem”, “sonhador”, “frenético”, “absurdo” e “repetitivo”. Hegel também apresentou uma crítica social mordaz à ordem de castas, um tema recorrente em muita de suas obras. Portanto, a questão provocativa central é: se a arte, religião e filosofia indianas são extremamente inadequadas para o sistema de filosofia de Hegel, o que explica seu fascínio incomparável, ao longo de décadas, por elas?

A resposta padrão (quando alguém preocupa-se em abordar a questão) é que Hegel simplesmente procurou mostrar que ele era mais sábio e mais culto que muitos de seus rivais, especialmente os românticos alemães. Isso é verdade em alguma medida, mas não é suficiente para explicar a consistência do interesse de Hegel, ou, por exemplo, o aparecimento de suas reflexões sobre o pensamento indiano, até mesmo nas seções finais de sua Enciclopédia. Hegel poderia ter orientado essa agenda anti-romântica através de numerosos outros meios além da Índia. E até se a arte, religião e filosofia indianas fossem os melhores domínios para Hegel eclipsar e superar seus rivais, ainda dificilmente isso explica a obsessão visível em suas mais importantes volumosas abordagens envolvendo o espírito indiano. É muito mais adequadamente explicativo assumir, ao invés, que o pensamento indiano intrigou Hegel por seus próprios méritos, e não apenas por ser representante de uma rivalidade.

De fato, uma leitura atenta de seus escritos sobre a Índia tende a sugerir que o pensamento indiano realmente assombrava Hegel de alguma maneira. Representava um tipo de gêmeo persistente que ele precisava seriamente se livrar ao longo do desenvolvimento da sua própria filosofia. Esse gêmeo claramente possuía algum respeito dele. Hegel mesmo indica a semelhança da filosofia indiana com seu próprio pensamento, como o conceito de Absoluto (Brahman). Ele, porém, alcançou dois pontos de clareza do seu próprio pensamento ao distingui-lo da filosofia indiana: o primeiro era focar em seu tema central da liberdade, protestando, assim, eternamente contra o sistema de castas da sociedade indiana, e tentando ler rastros e ressonâncias do casteísmo no interior de toda amplitude e profundidade da história, política, arte, religião e filosofia da Índia. O segundo era indicar uma necessidade de mediação dialética progressiva. Assim, ele frequentemente aludia à estase indiana como um contraste.

Mas, Hegel realmente conseguiu exorcizar esse gêmeo que assombrava seu trabalho? Depois de trabalhar ao longo do imenso corpus de escritos de Hegel sobre a Índia, o leitor pode encontrar motivo para duvidar disso. Contudo, certamente não foi por uma falta de Hegel ter tentando veementemente.

 


Autor: Aakash Singh Rathore

Publicado:  15/01/2018

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Tradução: Carla Oliveira


Revisão: Sofia C. Russi

Arte: Felipe Aiello

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