I think I’ll stay on this
earthquake fault near this
still-active volcano in this
armed fortress facing a
dying ocean & covered w/dirt
while the
streets burn up & the
rocks fly & pepper gas
lays us out
cause
that’s where my friends are,
you bastards, not that you know what that means.
—Diane Di Prima, “Revolutionary Letter #52”
O movimento contra a deportação em massa vem se intensificando há semanas. De São Diego
à Martha’s Vineyard, confrontos espontâneos com os agentes do ICE já vinham acontecendo.
Paralelamente, houve ações organizadas de ativistas, incluindo as tentativas de bloqueio das vans do ICE no centro de Manhattan.
Todos sabiam que a situação estava prestes a explodir. Finalmente, em Los Angeles, aconteceu.
Multidões juntaram-se em resposta aos ataques do ICE em várias vizinhanças. Seguiram-se
protestos noite após noite em frente ao Metropolitan Detention Center, para onde os migrantes
presos vinham sendo levados.
Esforços para impedir os ataques do ICE e os centros de detenção resultaram em confrontos
com a polícia. A multidão se espalhou pelo centro e por outros bairros. Protestantes bloquearam
as ruas e estradas, lutaram contra a polícia com pedras e fogos de artifício, construíram
barricadas e incendiaram automóveis. Trump decidiu enviar a Guarda Nacional e logo a seguir
a Marinha.
A explosão tinha de acontecer em Los Angeles. Mas agora que o fogo foi aceso, está
começando a se espalhar. Manifestantes apareceram em dezenas de cidades ao longo do país.
Seguem-se, sem pausa, centenas de prisões. O Texas e o Missouri mobilizaram a Guarda
Nacional.
Tensões espalham-se no interior dos centros de detenção de imigrantes. Uma revolta dentro do
Delaney Hall Detention Facility em Newark, resultou na destruição de um muro e na fuga de
dezenas de migrantes. O centro de detenção, que apenas reabria, deve fechar.
O que se segue são algumas lições da batalha de Los Angeles que podem ser úteis hoje, à
medida que o movimento para deter a máquina de deportação se espalha e aprofunda.
I.
Protestos só são eficazes se forem disruptivas. O movimento contra o ICE se tornou o mais
importante desafio ao novo governo Trump. Ao interromper a máquina de deportação, o
movimento revelou a única fonte de poder que as pessoas comuns possuem.
II.
Para que continue a ser eficaz, a disrupção deve se espalhar. As tensões se espalharam de
bairro em bairro em Los Angeles e daí para dezenas de cidade ao redor do país. Agora, os
protestos estão delimitados a pequenos setores nas áreas centrais das cidades. Se pretende
vencer, o movimento deve continuar se espalhando em cada cidade do país, atraindo camadas
cada vez mais amplas.
III.
Bloquear tudo. Durante a batalha de Los Angeles, os bloqueios se espalharam a partir de
vários bairros até o Metropolitan Detention Center e depois às rodovias e linhas de trem. À
medida que o movimento se expandia, os bloqueios continuavam a alcançar os bairros, centos
de detenção, rodovias, vias públicas e, a partir daí, aeroportos e outras infraestruturas ao redor
do país.

IV.
Poder é logística – ele reside na infraestrutura. A máquina de deportação requer uma
infraestrutura e um vasto aparato logístico. Essa logística deve ser estudada e a
infraestrutura mapeada, revelando os pontos de ruptura e as aberturas às novas táticas.
V.
Um ritmo consistente dá ao movimento algo a que se orientar, possibilitando uma ampla
auto-organização. Centros detenção e prédios federais são simbólicos e parte da
infraestrutura. Protestos diários ao redor desses espaços possibilitam uma abertura ao
crescimento de um movimento diverso e auto-organizado. Mas isso tem limites. Pode
facilmente aprisionar os participantes numa guerra incessante e exaustiva com retornos
diminutos.
VI.
A cidade inteira é um campo de batalha. Espalhar as lutas ao redor da cidade
interromperá o funcionamento da máquina de deportação. Deve ocorrer mesmo quando os
manifestantes não estão bloqueando diretamente a infraestrutura de deportação.
VII.
A espontaneidade muitas vezes já está organizada. Os levantes são geralmente
espontâneos, mas a organização pode contribuir para a sua circulação, extensão e
intensidade. Multidões começaram a se juntar espontaneamente em resposta aos ataques do
ICE em Los Angeles. Em seguida, grupos de ativistas convocaram protestos no centro de
detenção. Isso ajudou a sustentar o ímpeto do movimento e espalhar a sua atividade por
toda a cidade. Protesto continuarão a emergir como respostas espontâneas aos ataques. O
movimento deverá aprender como tomar sua iniciativa e definir o seu ritmo.
IX.
Os ativistas podem contribuir para o modo como o movimento se difunde. Canais de
comunicação que são claros, confiáveis e consistentes são fundamentais. Isso irá contribuir
para o crescimento do número de participantes e a construção de uma ecologia na qual
muitas camadas de iniciativas e formas de auto-organização tornam-se possíveis.
XI.
Multidões determinadas podem afrontar a polícia. O LAPD foi confrontado por
multidões combativas, além de diversa, criativa, imprevisível, descentralizada e difusa.
XII.
A repressão pode fazer com que os protestos se espalhem. O envio da Guarda Nacional
às vezes põe fim à agitação. Outras vezes, faz com que os protestos se tornem mais
generalizados e intensos à medida que mais e mais pessoas vão às ruas.
XIII.
Uma situação revolucionária se abre quando as forças armadas são mobilizadas
para as ruas. Ainda não chegamos ao nível da crise, mas é necessário começar a considerar
as questões levantadas a partir disso.
XIV.
A infraestrutura real necessária para que o Estado realize deportações em massa
ainda não existe. Ela está sendo montada de forma fragmentada. O objetivo, por enquanto,
é criar um espetáculo. Nesse cenário, eles podem ser derrotados.
XV.
A estratégia do governo Trump é aumentar a polarização e a desordem. Trump está
tornando as cidades americanas menos governáveis. Isso pode ser usado contra elas. Muitas
vezes, aspirantes a autocratas são desfeitos por seus próprios erros. Revoltas sempre levam
ao aumento da polarização. Isso é inevitável. Algum momento isso se tornará impossível.

XVI.
As tensões entre governos locais e o governo Trump criaram brechas para os levantes
de George Floyd. O movimento atual pode se beneficiar dessas contradições. Mas é
importante evitar que a luta seja redirecionada para as urnas. Os Bidens, Kamalas e
Newsoms deste mundo não têm nada a oferecer.
XVII.
As revoltas são frequentemente desencadeadas por um grupo social específico. Mas
a base social precisa se expandir para que tenham sucesso. A luta para derrotar ou abolir o
ICE começou nas comunidades de migrantes. Precisará se expandir, atraindo camadas
muito mais amplas da sociedade.
XVIII.
Os governos aprendem com os sucessos e fracassos da agitação social. Os
insurgentes precisarão fazer o mesmo. Trump tem se queixado frequentemente de não ter
enviado a Guarda Nacional a Minneapolis antes. Se o governo federal quiser ser mais
rápido e proativo na intervenção em conflitos locais, os tumultos poderão ter uma janela de
oportunidade menor. Os insurgentes precisarão aprender a ter confiança e capacidade para
tomar ações ousadas e agir de forma decisiva.
XIX.
O futuro pertence aos que ousam. O movimento deve tomar e manter a iniciativa,
impondo seu ritmo aos acontecimentos. Uma vez iniciada uma revolta, o movimento deve
agir com a maior determinação e, por todos os meios, sem falta, partir para a ofensiva.
Surpreenda o inimigo e aproveite o momento em que suas forças estiverem dispersas.
Busque sucessos diários, por menores que sejame mantenha a todo custo um moral elevado.
XX.
Não existe uma solução única. Será preciso que todos nós, empurrando a coisa de
todos os lados, a derrubemos.
XXI.
“Duas, três, muitas Los Angeles.” Será necessária a abertura de novas frentes e a
disseminação de táticas cada vez mais disruptivas para acionar o freio de emergência da
máquina de deportação. A escolha à frente é clara: deportação ou insurreição.
Anônimo

Ricardo Menezes
Escritor, fotógrafo e tradutor. É membro da revista Zero à Esquerda.